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Entre Tejo e Sado

Por dentro dos dias e da vida

Por dentro dos dias e da vida

Uma piscadela de olho para ti, Rodrigo

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Ontem, ao fim da tarde, com a noite a nascer na penumbra, naquela miragem que abre as trevas, anunciando o fim do dia a partir. Parei. Olhei a distância imaginando o infinito, enquanto os meus passos sentiam, nos nervos, a energia da terra. Foi naquele instante que percorri o tempo, viajando por dentro da solidão que rasgava o horizonte, lá longe, muito longe, acenando num brilho reluzente e poético.

 
O sol beijava meus olhos, por entre nuvens de prata. Senti uma lágrima de cristal espreitar feita poema.
Um raio de luz rasgava as nuvens brancas, projectando bruscamente, na paisagem seu brilho prateado, incandescente, através de uma brecha que espreitava entre o azul do céu e as nuvens de algodão.
O sol cantava, dentro desse instante, único, por onde imaginei a vida a fazer-se eternidade. Olhei. Sorri.
 
Nesse instante encostei os meus olhos no teu sorriso que brilhava, em meditação, nos meus neurónios. Caminhei por dentro da solidão das palavras, esse lugar onde a morte sorri à vida.
Imaginei teus braços erguidos, entre a folhagem dos plátanos, na Avenida da Praia, erguendo a cruz, bem alto, como quem quer beijar e abençoar as águas do Tejo.
Ali, olhei teus olhos. Sorriste. A pétalas de rosas deslizavam, suaves, voando entre a multidão e as ondas do Tejo. Eram pétalas que teciam um tapete colorido no cais e vestiam as águas, de vermelho e rosa, branco e amarelo, como raios de arco iris, a navegar no futuro, o sol, que é a luz de todas as miragens.
 
Ali, olhei teus olhos que transmitiam ternura e uma alegria enorme de felicidade, brilhantes em oração, no seio da multidão que mergulhada no silêncio da fé, cantava ao ritmo da tua voz.
“Avé Maria, cheia de Graça”, um coro de fé, essa força interior, que só sente cada um que a tem, uma força que não se explica. Que existe ou não existe.
Tua voz era o sol que unia toda aquela multidão, num cântico, de sonhos, gratidão e esperança, Crença. Tradição. Memória.
 
A procissão da Nª Srª do Rosário seguia pelas ruas do Barreiro Velho, essas ruas génese de um território que é raiz de uma comunidade, essa comunidade que tu dizias: está-me no sangue, na fé e no sacerdócio! Barreiro.
Uma comunidade que amaste com a tua fé e abraçaste com o teu coração.
 
A Banda do Barreiro tocava, melodicamente, aqueles sons, timbrados, que davam ritmo aos passos de fé, feitos de gente de muitas opções ideológicas, que, ali, abraçavam a memória de gerações.
Num canto, em silêncio, eu espreitava e fotografava. Um ritual.
Tu seguias com teu olhar erguido, sóbrio, em passos de dignidade e humanismo. O teu lugar de sempre, era aquele que antecede os políticos, os crentes de circunstância ou de mero respeito institucional, solene, seguias tu, erguendo a cruz, símbolo da tua vida e da divindade.
Caminhavas sempre, sempre, com a energia que transparecia uma nobreza que nascia no coração, um humanismo que se sentia no timbre melódico da tua voz, que soava entre a rouquidão e um cântico.
Seguias. Eu observava a Procissão. Via aquela multidão que enchia as ruas de fé.
Sempre, mas sempre, naquele instante que teus olhos se cruzavam com os meus, sentia que os teus lábios sorriam, e, os teus olhos falavam comigo, discretamente, como quem diz : “Olá, como estás. Estás bom?!”. Piscavas os teus olhos. Eu retorquia. Sorrindo. Guardo esses momentos num canto das coisas belas da vida.
Guardo esse instante, como guardei, na memória, aquele dia que te conheci, antes de Abril acontecer, naquele tempo, entre a fé que, para mim, ficava perdida no tempo e a Liberdade que nascia no meu coração. Sabes, aprendi contigo a dor da palavra – Fascismo.
 
Depois, senti, ao longo do tempo que partilhamos o teu amor à Liberdade, e, que para ti, Deus se escreve com o silêncio que faz nascer a palavra gratidão, respeito, dignidade, e, no coração semeias a palavra esperança como sendo o sentido real para erguer, na vida, o sentido da palavra amor. Porque para ti Deus é Amor.
 
Sabes, um dia havemos de nos sentar, ali, junto ao Tejo, escutando os sons do sopro da vida, de Rão Kyao, e, divertimo-nos a olhar o sol deitado nas ondas.
Aqui fica uma piscadela de olho para ti, Rodrigo. Até sempre!
 

 

António Sousa Pereira

Saboreando a ternura de todas as aprendizagens

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No dia de hoje, há treze anos atrás, andei a passear pelas areias da Praia do Baleal e saltitei entre as rochas junto à ermida.

Era o meu primeiro dia na situação de reformado. Fiz questão de estar ali naquele recanto junto ao Atlântico, onde um dia, li, com paixão, a mensagem de Fernando Pessoa. Cumpriu-se o mar. Falta cumprir-se Portugal.
É assim, um pouco, como as nossas vidas, há sempre algo por cumprir, mas, o belo é tentarmos viver com a vontade de tudo fazermos para nos cumprirmos. Nós e os outros. Nunca nos cumprimos sozinhos. O importante é viver preenchendo o tempo em plenitude. É isso cumprir!
 
Recordo hoje, aquela Ilha, onde falei, tantas vezes, com gaivotas e perdia-me a olhar os céus sorrindo. Voa. Voa. Voa, pensava, como se fosse o Fernão Capelo Gaivota.
Aquela Ilha onde enchia o caderninho de notas, projectos e sonhos. Ali, onde, um dia, com as ondas a beijar os pés, nasceu a ideia do jornal «Rostos».
 
Aquela Ilha da Ti’ Adriana que tinha um sorriso enorme, uns olhos lindos e cativantes, e sentada na muralha, beijava as ondas e as gaivotas deitavam-se nas suas mãos, marcadas pelos nervos do tempo e feitas de rugas da vida.
É verdade, faz hoje 13 anos. Que iniciei um tempo novo, esse que me permitiu sentir a energia do tempo, essa coisa simples, sempre a deslizar, que faz de nós tudo o que somos, respirando a vida.
O tempo é a unidade de tudo o que somos. Nele caímos. Erguemo-nos. Optamos. Escolhemos. Choramos. Rimos. Caminhamos. Sim, como diz o poeta, o caminho faz-se caminhado.
Estes anos afinal, que deviam ter sido de mera fruição, não foram anos fáceis. Foi a Troika. O Estado a levar-nos o sorriso. A humilhar a nossa dignidade.
Foi a pandemia. Os dias de confinamento. A ausência de calor humano. A saúde a quebrar o ritmo da vida. A solidão. A proximidade. Estivemos tão perto uns dos outros e tão distantes.
É tudo isto que nos faz sentir como viver é aprender a morrer. Recomeçando todos os dias.
 
Hoje aprendi o significado da expressão - Talitha Kum! Levanta-te!
É isso, disse para mim mesmo, nós, por vezes, nos nossos dias o que precisamos é de escutar esse apelo para mover a nossa vontade interior: Talitha Kum!
Hoje, 13 anos depois do começo da minha reforma, parece que escuto de novo essa expressão a tocar os meus neurónios – Talitha Kum!
 
E, talvez, sem me aperceber, foi esse som que escutei, muitas vezes nos meus nervos, sempre que ergui os olhos em sorrisos para escutar o meu coração ou beijar os olhos da vida- Talitha Kum!
Sim, talvez seja a idade que faz ter a consciência de sentir o peso do tempo a acumular-se nos ossos, ou acumular-se nos neurónios, saboreando a ternura de todas as aprendizagens. Respirando. Apenas respirando.
 
Hoje, pela manhã, junto ao contentor de lixo, um homem esgravatava. Em busca de si mesmo A história repete-se.
A fim da tarde, uma amiga, comentava comigo que o Núcleo do Re-food Barreiro deve ser neste momento aquele, em Portugal, que dá resposta a maior número de pessoas.
É vida.
Escrevo esta crónica, ao fim do dia…talvez apenas para respirar e sentir o som do universo.
É vida…
 
António Sousa Pereira

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