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No principio do mês de fevereiro registou-se uma ruptura na rede de abastecimento de água do Lavradio, e, naturalmente, para resolução dos problemas originaram foram necessárias intervenções na via pública. Até aqui tudo bem. Mas passadas mais de três semanas o facto é que os passeios continuam por arranjar.
Uma intervenção desta natureza obrigava, obviamente, que após a resolução do problema da ruptura de água, fossem tomadas as indispensáveis medidas para repor os passeios e os arranjos na via pública.
As obras aconteceram na Avenida J.J. Fernandes, em pleno centro do Lavradio, uma artéria por onde circulam diariamente pessoas idosas e crianças.
Na proximidade de equipamentos sociais, como é o caso da SFAL, ou de uma empresa de Análises Clinicas.
Pessoalmente, já assisti a situações que podia, ter sido penosas, até um carro, por mero caso, e, por um grito de alerta um transeunte, não embateu numa das pedras por ali espalhadas.
Fica pois, aqui, este registo e o apelo a quem de direito no sentido de serem tomadas as medidas necessárias para que este assunto não se arraste no tempo.
Obrigado!
António Sousa Pereira
No sábado, o Grupo de Teatro Projéctor levou a cena a sua 42ª produção, a peça «O Quadrado de F.», de Filipa Leal, com encenação de Abílio Apolinário.
Uma peça que nos prende às palavras, que nos motiva a desocultar conceitos, uma peça onde sentimos o diálogo que se estabelece entre os movimentos do corpo e a energia das palavras.
Quero começar por dar os parabéns pelo salto qualitativo que encontrei na sala de espectáculos do Teatro Projéctor, desde o dia que lá estive na sua inauguração.
O auditório melhorou fruto da dedicação, empenho, voluntariado, e, pelo muito amor ao teatro e à cultura da associação cultural Teatro Projéctor, que, na verdade, está apostada em transformar a antiga escola primária da Rua Professor Joaquim Vicente França, num espaço vivo de criatividade na vida da cidade do Barreiro.
Em julho de 2022, estreou naquele espaço cénico a 41ª produção do Teatro Projéctor - «De lá para aqui» - com textos de Gil Vicente e encenação de Abílio Apolinário, uma peça que contou com uma brilhante interpretação de Luciano Barata, que, em palco, arrancou do seu coração toda a energia que faz do actor um criador de emoções e de humanismo. Na altura, por diversos acasos, não escrevi sobre este trabalho, e, hoje, não quero iniciar estas notas sem este registo.
Aquela peça - «De lá para aqui» - proporcionou um Gil Vicente que veio ao encontro dos dias de hoje, dos temas da actualidade, num trabalho feito com a harmonia e beleza. Digo, foi um esplêndido pontapé de saída para a inauguração do Auditório de Teatro Projéctor. Uma peça que teve a brilhante encenação de Abílio apolinário. Uma peça que anunciava o recomeço de um novo ciclo de vida e de sonhos na arte de criar e dar vida ao espaço e ao tempo.
Feita esta nota de «mea culpa«, falemos então desta 42ª produção do Teatro Projéctor.
A peça «O Quadrado de F.», refere o programa, é o primeiro livro de teatro de Filipa Leal, que integra quatro peças diferentes e inéditas. São elas: “Morrer na Praia”, “A Cama de Gato”, “À Espera de Samuel” e “O Quadrado de F.”. A peça conta com a excelente interpretação de Anabela Pereira e Elsa Assunção.
O texto numa peça de teatro é a semente, que faz nascer em flor a criatividade do encenador, e, proporciona a quem interpreta usar a sua sensibilidade e através dela dar vida aos personagens e, assim, fazer nascer o fruto.
Na peça «O Quadrado de F.», o texto tem uma força avassaladora, é exigente, para o encenador, paras as actrizes e para o público. Esta é uma peça onde o texto é central, é um texto que se realiza em palco, que se faz teatro, que se faz arte, que se faz beleza, que se faz memória e que se faz vida.
Esta peça exige das duas actrizes que sintam o texto com o coração, que vivam por dentro do texto, que arranquem das entranhas as palavras, que façam o espectador sentir cada adjectivo, cada substantivo, cada conceito, dando vida às palavras.
Anabela Pereira e Elsa Assunção estão excelentes. São interpretações de qualidade, e, acredito, à medida que a peça for entrando nos ossos, as duas actrizes vão dar mais, muito mais, força e, paulatinamente, fazer as personagens saltar por dentro dos nervos. Está lá tudo, a perfeita dicção, a sobriedade da compreensão do texto, a emoção da sensibilidade nos rostos, o ritmo e o pulsar do corpo. Ambas vivem de forma viva as personagens que nascem nas palavras, que brotam puras no contexto cénico.
Há momentos na peça que apetecia dizer – parem – e, fixar o instante, fixar a beleza do quadro, fotografar, e sentir a energia da contraluz, do preto e branco das situações a nascer na criatividade da encenação. A peça tem um ritmo de preto e branco. A peça tem um ritmo de luz e sombras. A peça tem um ritmo de sons e silêncios.
Esta é uma peça que nasce por dentro do cérebro, viaja por dentro do cérebro – mente, a consciência, a alma – o que quiserem é uma peça que toca os neurónios, que beija o hipotálamo, que se move pelas cicatrizes da memória, que nos faz mergulhar na infância, que toca os silêncios dos tempos que todos vivemos, na procura do amor ou da amizade e de nós mesmos. Nós e os outros. Eu e Tu.
O texto é bem interpretado e nessa interpretação a energia das palavras dançam e dialogam com os movimentos corpo – o amor que para uns é sexo, o tocar, o beijar, o sentir o corpo e os lábios. Ou amor que é a espera do Príncipe encantado. O poeta. As metamorfoses kafkianas. O quadrado do círculo. As prisões da consciência ou de ausência de consciência. O comunicar, ou não.
Uma peça queque toca as paixões, as psicoses, as neuroses, que nos faz mergulhar até à porta da loucura. Uma peça da psicologia, ou da psiquiatria. Ou, talvez, apenas, uma peça que nos faz pensar e sentir a importância da comunicação, ou da ausência de comunicação, nas relações humanas.
Um peça que nos motiva revisitar a criança que temos dentro de nós, o silêncio, ou os nossos silêncios, esses recantos que nos empurram para a nossa interioridade, para o nosso eu, o nosso tu, ou o nosso nós. Uma peça que nos faz rir com a solidão, a loucura, e, viajar entre o absurdo e a ironia da vida.
Uma peça que nos faz sentir a beleza e a ternura de ter um ombro onde encostar o rosto e sentir o pulsar do coração. O lugar de ternura dos sonhos. O brilho dos olhos.
Uma peça com beleza plástica feita de simplicidade, quer da encenação, quer na musicalidade bethoviana, a luz, as sombras. Tudo faz sentido. Uma peça com duas actrizes brilhantes a encher o placo da palavra Mulher, actrizes que dão força ao texto, vivendo com ritmo, um ritmo que se faz num diálogo permanente entre a força das palavras e os movimentos do corpo.
O diálogo entre o psicológico e o físico, entre o corpo e a mente. O ser humano na sua plenitude.
Um espectáculo feito com autenticidade, vivido com autenticidade, num tempo marcado por clichés, vazios, e, tanta espuma que desfaz na penumbra dos dias.
António Sousa Pereira
O sol está escondido, deitado por trás das sombras, que brilham em silêncio, rasgando os meus olhos, nesta tarde de janeiro, fria, fria, tão fria, como está o meu coração. Silencioso.
Imagino que acenas de lá, nas asas daquele pássaro que reluz no sol, com um poema, escrito ALGURES NO TEMPO, isso que somos, isso que faz as nossas vidas. MOMENTOS.
POR UM INSTANTE, imagino-te a declamar um poema, nesta tarde, feita de palavras, PEDAÇOS DE ESCRITA, sufocadas na garganta. Parece que a vida, afinal, é, ou não é, pensamentos CEM SENTIDOS. Olho o sol escondido. Vejo-te sorrir.
Escrevo estas palavras, para ti, e penso: SE FOSSE TÃO SIMPLES ASSIM!
Foi tudo tão rápido, inesperado, triste. Em 30 de Setembro, conversámos, via chat, e, fomos estando ligados. Como vai isso Kamarada?, perguntava. Kamarada, com Kapa, como era o hábito, entre nós.
Tu respondias: Estou no início do maior desafio da minha vida. Doeu. E silenciei.
Fomos trocando mensagens, pontuais. Conversa entre nós dois.
“Não deites a toalha ao chão. Grita. Arriba.”, dizia-te.
“Estou a tentar meu amigo.”, respondias.
A última vez que comunicaste foi a 22 de dezembro, a tua resposta foi apenas: abraço.
É esse abraço que te dou hoje, neste dia 14 de janeiro, estejas lá onde estiveres, tenho a certeza que estás a voar, sorrindo, entre poemas, naquele raio de sol que vi a brilhar nesta tarde fria.
Foste das primeiras pessoas com quem partilhei os meus dias quando vim para esta terra. Foi na Comissão de Redacção dos Jogos Juvenis do Barreiro. Nesses dias, que escrevíamos no «Continuando», o boletim do JJB, que tinha este título como provocação, porque a PIDE editava uma revista que era «Continuidade». Conversámos tantas vezes. O amor ao fazer vida, na vila operária.
Esses dias, antes de Abril acontecer e, onde, sabes, a palavra amizade começava a escrever-se num olhar, num simples olhar de cumplicidade. Ficamos amigos. Cada um seguiu pela sua vida. Encontramo-nos várias vezes. Ou, no Futebol Clube Barreirense, onde também fui da Direcção. Ou em entrevistas, quando eras dirigente da PERSONA. Ou nas noites de tertúlia na Associação Civica, quando exerci a função de Director do Jornal do Barreiro. Encontramo-nos na Câmara Municipal do Barreiro, quando foste vereador, e, eu, funcionário público.
Como estás Kamarada, com kapa?, era sempre o nosso cumprimento.
Um dia convidaste-me para beber um café, para conversar. Levavas contigo um conjunto de originais, para eu ler. Trazias um desafio.
“Gostava que apresentasses o meu primeiro livro de poemas?”, disseste. Fiquei surpreendido, porque, tu, tinhas sido, para mim, um Mestre, uma referência, nestas coisas da escrita e do jornalismo.
Aceitei o desafio e com muita honra escrevi o texto prefácio e apresentei o teu primeiro livro de poemas, com o Manuel Alpalhão a declamar de forma brilhante, E, eu, entusiasmado, a falar de Pessoa e nos “eus” das emoções dos teus poemas.
A escrita estava dentro dos teus nervos, fluía, nascia como flores num jardim, ora em livros de contos, ora em poemas ou pensamentos.
Fomos conversando em jantares de Tertúlias. A palavra estava inscrita no nosso sangue. Unia-nos.
Escrevias as tuas crónicas no jornal Rostos e telefonavas. Ficávamos a conversar sobre os temas, os contextos. A cidadania. A cidade.
Sempre que editavas um novo livro, ligavas a marcar um café, para conversarmos e oferecias-me um exemplar, com dedicatórias de carinho e amizade – essa amizade de 50 anos. Eu lia os teus poemas. Tu sorrias.
Hoje, quando li as palavras da tua filha Ana, viajei perdido, algures pelo tempo, e, por um instante, vivi no meu pensamento muitos momentos, da vida que partilhámos, e, de tudo isso faz, estes pedaços de escrita, para te dizer : Até sempre! Obrigado pela tua amizade!
Olho a rua. A noite desce na cidade. Penso ir dar-te um poema nesta hora da partida.
Se tudo fosse tão simples assim…esta lágrima, que teima em beijar a noite, não descia no meu rosto.
António Sousa Pereira
Fotografia - Na SDUB «Os Franceses», em abril de 2022, no dia que decorreu o ROSTOS VIVO. Tu, eu e o Francisco Naia.
Rita Raimundo de Sousa
Há cerca de um mês atrás encontrei o Arménio, ali, perto do Luso Futebol Clube, disse-me que estava triste porque tinha morrido uma amiga dele, uma camarra, como ele, que são aquelas pessoas que fazem parte da história pura do Barreiro, gente que se olha, olhos nos olhos, com respeito pelas diferenças e sem distinções sociais.
Conheci o Arménio na sua missão de empregado de mesa, no Restaurante «O Colega», na Avenida Henrique Galvão, naqueles almoços tertúlia, onde tudo se discutia, nos tempos que fui Chefe de Redacção e Director do «Jornal do Barreiro». Também o encontrei no Joaquim dos Petiscos. Um homem de trabalho que se fazia por si mesmo.
Um profissional sempre com um sorriso nos olhos, simpático e brincalhão.
Ficou como senha, entre nós, aquela canção que ele a brincar, entre os caracóis e o pão torrado que tardava, usava para distrair e com ironia: “Ai que sarilho, ser pai de um filho, vai ser João, como o patrão”. E ria, a bom rir.
Um empregado de mesa, que rodopia entre clientes, ouve muitas histórias, observa, e, silencia o diz-que-diz-se, que faz parte do quotidiano. O Arménio era isso, um bom profissional, um homem discreto e de uma grande pureza e simplicidade.
Sempre, fosse onde fosse, que me cruzasse com o Arménio, cantávamos em coro: “Ai que sarilho, ser pai de um filho…”. E depois, um cumprimento de amizade partilhada.
Soube hoje, pelas redes sociais, que morreu o Arménio, e com ele, sinto que parte mais um pouco deste Barreiro Camarro, que respeito e que aprendi a guardar na minha memória, mais por estórias contadas, mas, também de estórias vividas. Esse Barreiro da Nª Srª do Rosário e do Rio Tejo, da Rua Aguiar que se estende até ao Alto de S. Francisco, um lugar génese de uma identidade.
Morreu o Arménio, aos seus familiares e amigos os meus sentimentos.
É isso, até sempre Arménio: Ai que sarilho ser pai de um filho…
António Sousa Pereira
Hoje dei comigo a pensar em tempos idos, naqueles dias que não tinha horas para dormir, que saltava de uma actividade para outra, sem pensar em mais nada, se não sentir o prazer de fazer, construir, criar, sonhar e amar a vida. Viver. Nesses tempos, vivia os dias com uma intensidade que me deliciava no fazer, no pulsar do quotidiano. O importante era sentir a cidadania, a vida activa e os resultados das ideias transformarem-se em acção.
A minha ambição era viver e sentir a vida, era, e, digo-vos continua a ser, e, acreditem, espero que nunca deixe de o ser, para mim o mais belo da vida foi sempre fruir a vida, abraçar o tempo que vivo com o coração, viver todo o tempo com o tempo a galgar os meus nervos.
E na medida que o tempo passa, cada vez mais sinto, afinal, neste tempo que existimos, neste aqui e agora, por cá estamos, e registamos que tudo se esvai, por isso, o belo é sentir o sabor da vida, o mais belo da vida é ser. Ser como quem sente a eternidade.
É por isso que gosto de envelheSER. Manter sempre viva, em sorrisos, a alegria de viver, sempre com um sorriso, que me anima, perante todos os desafios e adversidades.
Hoje, pela manhã, recordei os tempos idos, nesse ritmo de dormir. O tempo para dormir é sempre indispensável. Descansar e retomar energias.
Nunca fui pessoa de dormir muito, mas, contraditoriamente adoro dormir, e, talvez, por essa razão quando adormeço é mesmo para adormecer. Sempre dormi pouco nas corridas do dia-dia. Mas, depois, aos sábados ou domingos, por vezes, dormia, horas e horas, até sentir os ossos acordar numa tranquilidade silenciosa.
E foi por essa razão que, hoje pela manhã, pensei nesses tempos idos. Que bela soneca. Acordei como se fosse um sábado ou domingo, daqueles de outros tempos. Acordei com os ossos a sorrir, esticando os braços como quem quer agarrar o sol. Uma tranquilidade matinal de ternura.
Depois começou o dia, as coisas que nos acontecem que enchem o tempo que vivemos.
Numa esquina da vila, lá vi uma senhora sentada no chão, a fazer crochet e das suas mãos saiam umas giras bonequinhas. Vejo-a por ali, há vários dias, sempre na mesma esquina, horas, sentada a lutar pela vida.
Hoje decidi meter conversa. Parar. Perguntei-lhe o preço das bonequinhas. Ela disse-me e sorriu para mim, comentando : “Você conhece-me”. Olhei e não reconheci. Disse-me quem era e comentei o nome de familiares. Sim, sou.
Perguntei-lhe se era sem abrigo. Comentou que não. Tenho casa. Foram tempos difíceis. Comentou – “mas está quase a passar”, disse-me.
Então não desista, comentei, e acrescentei – “Sabe, José saramago tem um romance com o título: Levantados do chão! Levante-se”.
“Tem que ser, disse-me ela, e com um sorriso interrogou: “Não é essa a vida dos portugueses?” E sorriu.
Segui o meu caminho. Pensando na vida, nas vidas.
E, ao fim do dia cá estou a escrever estas palavras pensando numa mulher, sentada na esquina da cidade, na luta pela vida, sentada no chão e com um sorriso afirmando: Está quase a passar.
Isto, no dia que acordei com os ossos a sorrir e o passado a mergulhar nos meus nervos. Sorri.
António Sousa Pereira
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