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Entre Tejo e Sado

Por dentro dos dias e da vida

Por dentro dos dias e da vida

Centenário do nascimento de Augusto Cabrita Do amor, do belo e do…sorriso

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Fui hoje, dia que assinala o centenário do nascimento do Mestre Augusto Cabrita, convidado para conversar com mais de uma centena de alunos do 12º ano da Escola Secundária Augusto Cabrita.
Não sou fotógrafo. Não sou cineasta. Não percebo nada de fotografia, nem de cinema. Por essa razão, interroguei-me sobre que hei-de falar.
 
Tomei a opção de falar sobre o homem que conheci, de quem guardo momento de ternura únicos, inscritos na minha memória.
Por essa razão, falei do homem que conheci, com quen passei instantes da vida, momentos que permitem sentir a palavra dignidade, amizade ou simplicidade.
Disse aos jovens, que, neste centenário para além de se falar da obra, da sua actividade no mundo da fotografia e do cinema, talvez, fosse importante darmos um contributo para conhecer o pensamento, o homem, o cidadão.
 
Afinal será darmos a conhecer aquela pessoa que eu senti, na vida real pura e dura, que unia a forma de pensar, com aquilo que dizia e aquilo que fazia. Isto é que é lindo.
Isto é viver, fazendo o que se gosta, sentindo o que se faz, amando com o que se transporta pelo olhar para dentro do coração. Isto é harmonia.
 
Foi com o Mestre Augusto Cabrita que na minha ingenuidade e aprendizagem de vida, porque a vida é uma constante aprendizagem, aprendi a abraçar com os olhos o quotidiano.
O Mestre Augusto Cabrita afirmava e nunca mais esqueci esta frase: “A beleza existe, de facto, em toda a parte, a dificuldade é saber encontra-la”.
Foi neste pensamento que comecei a sentir a importância de encontrar a beleza nos meus dias, desbravando os pormenores, os recantos, os contrastes, os silêncios – a luz e a sombra. O preto e branco.
 
A beleza da vida está na nossa frente, o belo é nós captarmos essa beleza com o nosso olhar, com o nosso ouvir e transportar essa realidade para dentro dos nossos nervos e semeá-la no coração. Isto é amar a vida. O Mestre Augusto Cabrita amava a vida, cultivava o amor e amizade. O respeito pelo outro. Ele sabia que o seu eu, se transformava num tu, pela partilha, pelo respeito. E nesse abraço construía o nós – a sua rua, o seu bairro, o seu Barreiro e as suas gentes.
 
O Mestre Augusto Cabrita, afirmava: “O prólogo da minha volta de todos os dias é exercitar o olhar através da janela do meu quarto. Sinto que já ganhei o mais belo prémio do mundo: Tenho o Tejo à minha frente”.
Sim, o Tejo. O Tejo é central no pensar e sentir a vida na obra de Mestre Augusto Cabrita. O Tejo é o seu olhar sobre a paisagem. Ele deu um contributo essencial para ligar a cidade ao rio. Amava as zonas ribeirinhas do Rio Coina, do Rio Tejo, do Rio Judeu, no Seixal. O Tejo é para ele um importante património natural e cultural.
 
Pelo Tejo, como dizia Fernando Pessoa – “vai-se para o mundo” e no Tejo está tudo o que lá não está, a memória das naus.
Por isso, o poeta sublinhava que gostava mais do rio da sua aldeia, porque quem está ao pé dele, está só ao pé dele.
E dei comigo a pensar, que quando estou sentado junto ao Tejo – a que chamo a minha Catedral, naquele lugar que se identifica como Passeio Ribeirinho Augusto Cabrita – sei que pelo Tejo vai-se para o mundo, mas, quando por ali estou sentado, nas suas margens, sinto que este é “o rio da minha aldeia”, sinto que quem está ali, sentado, naquele silêncio, está ao pé dele, só ao pé dele, por isso o Tejo é lindo, só o sente quem sente a energia das suas ondas e da sua cor. O Mestre Augusto Cabrita sentia essa energia.
 
E, também, ali nas margens do Tejo, ele sentia o ritmo e a vida a deitar seus olhos no voo suave e terno das gaivotas, no seu deslizar, na sua fluidez silenciosa de movimentos.
A gaivota que o Mestre Augusto Cabrita adorava, era um símbolo de sensação de liberdade, de ternura, de cântico. Aquele canto de Zeca Afonso – “só há gaivotas em terra quando um homem se põe a pensar”.
O Mestre Augusto cabrita era um poeta da fotografia. Era um filosofo da fotografia. Ele pensava a vida com a sua máquina fotográfica. Ele escrevia poemas com a sua máquina fotográfica. Ele captava o ritmo, aquele que se sente no voo de uma gaivota, que se sente uma beleza perene e única.
 
É preciso pensar e sentir, quando os nossos olhos viajam com o voo de uma gaivota, sentimos a emoção de uma energia que se diz Liberdade, que toca os olhos e desce até ao coração.
O Mestre Augusto Cabrita ensinou-me a pensar com a luz, a luz que ele descobria na natureza: “O mais belo projector é o sol”, afirmava.
 
Um dia sentado com ele a conversar em Alburrica, de repente levantou-se e disse, - “é agora” - começou a registar o instante, quando a luz solar abriu o esplendor de Alburrica que ele serenamente aguardava. Captou o instante. Aprisionou a luz.
“A fotografia é a emoção petrificada no momento” era o seu conceito de fotografia.
 
O Mestre Augusto Cabrita descobria, pelas imagens, os sons escondidos no silêncio da paisagem. O som que é o outro lado do silêncio. As suas fotografias fazem sentir o silêncio das paisagens e dos rostos humanos.
Ao olharmos uma fotografia do Mestre Augusto Cabrita, temos que ser capazes de desocultar a melodia que está nos seus contornos. Ler o que está por trás daquilo que vemos.
 
Sim, estamos a comemorar o centenário do nascimento do Mestre Augusto Cabrita, e devíamos falar da sua obra, mas também dar a conhecer o homem – o homem que vivia fazendo o que gostava. Que viva com amor pela vida, com paixão pelo belo e sempre com um sorriso de ternura no coração.
 
Um homem com ética que tinha uma grande alegria de viver, que dava sem esperar nada em troca. Um homem integro de grande humanismo, respeitador das diferenças e dos valores que herdou da sua terra, a terra que vivia de relações de vizinhança, de uma cultura de fábrica, da sua família, do seu lugar camarro. Uma terra solidária.
 
Um homem que humanizou a fotografia, com equilíbrio e harmonia, unindo pensar, falar e ser. Ética.
Um homem que abraça a beleza da vida, com uma dimensão estética que começava no pulsar do seu coração a abraçar o belo com aa seus olhos.
 
O seu legado, o seu espólio era merecedor de uma Casa Centro Interpretativo, dar a conhecer o homem e a obra, de forma a colocar o Barreiro na Rota Mundial da Fotografia
 
Pensar o Mestre Augusto cabrita é pensar o belo, é pensar a luz, é pensar a paisagem, os rostos humanos, a natureza…o tejo e a gaivota. O nosso património natural e cultural.
O Mestre Augusto Cabrita viveu e partiu com um sorriso. Amou o Barreiro. Viveu abraçando a vida.
Quando falamos do Mestre Augusto Cabrita devemos recordá-lo com as palavras: Dignidade, Criatividade, Simplicidade, Amizade e Humanidade.
Uma vida indissociável da cultura da sua terra: Barreiro.
 
O meu voto é que todos vocês, um dia, no futuro, sintam orgulho de recordar a vossa escola e sentir no coração a memória do Mestre Augusto Cabrita.
“Eu fui aluno da Escola Augusto Cabrita”, afirmem com orgulho.
Obrigado pelo convite de estar aqui neste dia que se assinala o centenário do seu nascimento.
 
António Sousa Pereira
Escola Augusto Cabrita
Barreiro – 16 de março de 2023

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